Cláudio André de Souza*
O inicio do horário eleitoral na tevê e no rádio consolidam uma tendência: a importância da propaganda como uma forma de comunicação política com os eleitores. Analistas políticos, militantes e quadros partidários, além da grande imprensa, encaram o horário eleitoral como um divisor de águas na busca do voto. Sendo assim, o horário gratuito reflete as tendências de cultura política que forma e são formadas numa relação recíproca entre representantes (candidatos) e representados.
A propaganda eleitoral apresenta em linhas gerais um fato a ser pensado e discutido, o quanto as pessoas reconhecem a importância e as atribuições do poder legislativo. As candidaturas postas nas eleições há algum tempo são alinhadas com a percepção do legislativo como uma instituição subordinada ao executivo. Em termos de padrão de carreira política, sabemos que o legislativo é um caminho para os seus parlamentares pleitearem candidaturas majoritárias. Reproduzem, decerto, um comportamento e uma cultura política que ratifica a plasticidade do legislativo, ligado umbilicalmente aos interesses e projetos do executivo. O primeiro não recebe vida própria pelo segundo, vide o voto ser baseado em grande parte na distribuição de recursos materiais, revelando um pragmatismo nas eleições que ofusca o propósito da democracia e da representação política pensar o voto como a conjunção de interesses, perspectivas, valores e identidade de eleitos com eleitores.
Distante de uma incongruência, é razoável a população conceber os parlamentares como “despachantes de luxo” do poder executivo, como analisara Marcos Bezerra em sua obra cara ao tema – Em nome das bases (Ed. Relume-Dumará, 1999) - fruto de uma prática política que torna o legislativo um espaço para o pleito de obras de infra-estrutura e programas governamentais, dentre outras realizações do executivo. A oferta e defesa a favor de recursos tem sido a principal forma de arregimentar o apoio do eleitorado. Trata-se da representação focada em interesses pragmáticos.
Uma democracia necessária para os desafios das sociedades contemporâneas sugere que retomemos como agendas de representação programas, interesses e valores na política. O pragmatismo que define os representantes legislativos como meros “realizadores” auxiliares de obras e ações “executivas” esvazia o projeto republicano de autonomia e de singularidade do poder legislativo. Além do que, reproduz uma política de pequeno porte que faz da representação política apenas uma relação de escolha por candidatos assentados em programas do governo ou contra eles. A representação política e o legislativo – campo de ação da representação – devem ser capazes de amplificar a capacidade da política de pensar e redesenhar os valores que a norteia. Devemos caminhar a uma dilatação da representação em vez de ser o legislativo um lugar a representar o projeto do poder executivo. O legislativo deve ser um espaço amplo de debates e de diálogo.
A propaganda eleitoral não tem sido um bom indicador da existência de uma representação democrática. As chapas pelo Brasil a dentro andam cheias de candidatos que fazem da sua plataforma o pragmatismo que, ao final das eleições, ratificam em suma a pequenez da política democrática resumida a fazer do legislativo um espaço político que pouco delineia a sua proposta original pensada alguns séculos antes por pensadores políticos preocupados com os princípios (não-pragmáticos) da democracia e da república. Há candidatos que refletem – e são refletidos – por uma visão que põe o legislativo como um grande espaço da pequena política, abreviando o legislar ao ato de conseguir verbas e recursos para as suas bases eleitorais. Deste pragmatismo a democracia parece andar saturada. Um sinal de desgaste nesse sentido é o fato da maioria das pesquisas apontar altos índices de indecisão do voto para deputado e senador. Isso revela, decerto, que é desejável e necessário repensarmos: 1) os valores e o que é representar politicamente; 2) a reforma das instituições políticas e 3) o que norteiam os valores democráticos sedimentados na ação dos atores políticos, sejam candidatos e cidadãos comuns.
*Cientista político, professor de Sociologia da UNEB (Projeto Plataforma Freire, campus XIII) e aluno do mestrado em ciências sociais da UFBA.
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